3.12.20

CHAMO-TE AMOR


Chamo-te, seguramente, amor,
sagrando na desordem a palavra que pronuncio,
quando sabes que a tudo eu renuncio,
e te esvazio, e te evoco delicadamente em cada alvor.

Reconheço-te, acredita, meu princípio e narcisismo,
a completa transfusão do desejo e da loucura
rasgando vísceras e sangrando a compostura,
meu avesso em pensamento e delineado niilismo.

Chamo-te amor, mas não me peças que por cá te espere,
nada me apetece cumprir do que impões como norma,
nada do teu conluio com as horas me seduz ou conforma,
abandono tuas plataformas à imaginação que me impele.

Entendo-te, como tu a mim, neste milagre que desfere o tempo,
o embaraço das gentes suplicando-te um obscuro teorema,
e sei que me cingirás quando a sofreguidão dos meus temas
me aprisionar em teu diadema eclodindo o esperado momento.

Chamo-te, ainda esta vez, amor,
tal a primeva razão de existir que eu nunca rogara,
tal a memória que definha a sua narrativa amara,
tal o murmúrio traidor pela unção extrema de um louvor.

J.C.Lopes




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